terça-feira, 28 de junho de 2016

Do Que Eu Mais Sinto Falta?

Domingo passado o Chile ganhou pelo segundo ano consecutivo a Copa América. Contra a Argentina, nos pênaltis. Igualzinho em 2015. Vi os posts dos meus amigos chilenos, fotos das celebrações e churrascos e claro, deu saudade. Ano passado eu tava lá nessa mesma época, assisti a final no hostel, bebi, comemorei com eles...

Resolvi hoje listar aqui as coisas que mais me fazem falta de lá. Talvez como uma maneira de desabafar, sei lá.

CAMINHAR
Lá em Santiago eu andava muito, o tempo todo. Ia andando da minha casa até o trabalho, do trabalho até a feira, da feira até o supermercado e depois andava de novo de volta pra casa. A cidade é infinitamente menor que São Paulo e é tudo plano. Então eu andava horrores, amava. E em qualquer canto, rua, esquina, tinha alguma arquitetura linda pra parar e tirar foto.

DISPENSAR O TRANSPORTE PÚBLICO
Relacionado ao primeiro tópico, morro de saudade de não depender de metrô e ônibus. Aqui em São Paulo obrigatoriamente preciso de dois ônibus e uma baldeação no metrô pra chegar no trabalho. E o mesmo pra voltar pra casa. Lá não, raramente usava transporte público. Não cheguei a conhecer todas as estações e algumas linhas eu nem usei.

TÁXI BARATO
Cara, isso faz MUITA falta aqui, principalmente na hora de sair de balada. Juro, desde que voltei tenho dispensado várias saídas porque tenho DÓ de gastar R$50.00 (ou mais) numa corrida de táxi. E não, não uso Uber porque não tenho cartão de crédito. De qualquer maneira, lá em Santiago era absurdamente barato. Com R$20.00 eu ia e voltava das baladas linda e feliz.

USAR A BICICLETA
Sei que o prefeito de São Paulo tem feito (fez) de tudo pra estimular o uso das bikes aqui em SP, mas não rola. A cidade é gigante, os motoristas aqui não respeitam, o asfalto é um horror e a cidade tem muita ladeira. Mesmo na Paulista fechada aos Domingos é um caos, porque é MUITA gente e nem sempre você encontra bicicleta pra alugar...

PARQUES E PRAÇAS
Comentei aqui uma vez que Santiago está cheia de parques e praças que são bem cuidadas e as pessoas frequentam com gosto. Sinto falta de ter um parque, mesmo que pequeno, perto de casa onde eu possa me sentir segura o suficiente pra ir a noite levar meu cachorro pra passear. Ou pegar um Domingo ensolarado com algum amigx e deitar na grama pra jogar conversa fora, ver crianças correndo, essas coisas bucólicas mas que aconteciam com frequência lá na capital chilena.
Sei que São Paulo tem vários parques, mas todos são de difícil acesso, ao menos pra mim. Tenho um cachorro e não posso pegar metrô/ônibus com ele. E não tenho parques próximos a minha casa como tinha lá :(

IR A FEIRA
Tá, eu sei que tem feira aqui em São Paulo. Inclusive tem uma perto da minha casa e acreditem, eu nunca fui. Por preguiça, medo de me decepcionar... se tem uma coisa que eu sinto falta é a de ir no La Vega e fazer a compra da semana. E ainda poder sentar no Tirso de Molina e comer um ceviche antes de voltar pra casa

REUNIÕES EM CASA
Uma coisa que eu achei muito interessante lá é como as pessoas tem esse costume de ir na casa do outro. Muitas vezes deixei de ir pra balada (leia-se discoteca/boate) pra poder ir na casa de alguém, encontrar outros amigos, levar uma(s) garrafa(s) de vinho, coisas pra beliscar e ficar até as 4, 5 horas da manhã dando risada e falando da vida.
Coisa simples que aqui não tem muito o costume de acontecer. Em São Paulo, se você quiser encontrar com alguém é: ou cinema, ou sair pra comer, ou barzinho ou balada. E vamos combinar? Não dá pra sair sempre aqui, porque tá TUDO MUITO CARO!

CORDILHEIRA
Sim, é algo muito específico que não tem aqui, mas que faz falta, ahn isso faz...

SE SENTIR TURISTA
Ok, eu nunca gostei muito de me sentir turista... mas em Santiago, gostava daquela sensação tipo: caraca, essa cidade tem tanto a oferecer, preciso conhecer tudo.
São Paulo é gigantesca e tem muita coisa que eu não conheço, mas nunca fui acometida por essa coisa de: quero conhecer tudo. Até tenho, sabe? Mas nossa, aqui tem tanta gente, tudo o que você faz tá sempre lotado, é toda uma logística que é preciso ser feita que dá uma preguiça...

ACESSIBILIDADE
Acho que isso também se relaciona com o tópico de cima. Se eu quisesse fazer um tour a pé por Santiago, eu acordava cedo, pegava o metrô e ia. Simples assim. Aqui dá um desânimo, porque como já comentei, tem MUITA gente nessa cidade e tudo tá sempre muito cheio. Uma simples exposição e você tem que ficar hooooooras na fila...

SEGURANÇA
Acho que isso é o que as pessoas que moraram fora mais sentem falta depois que voltam, né?
Claro, Santiago não é a cidade mais segura do mundo, tem trombadinha e assaltante sim e você DEVE ter cuidado com celular, carteira e máquina fotográfica. Mas em São Paulo, a coisa tá feia. Além de estar sempre alerta pra não roubarem seu celular no metrô lotado, ainda tem a ameaça do sequestro relâmpago, do cara estar armado e no meu caso, sendo mulher, o medo iminente de ser estuprada. É horrível :(

VINHO BOM E BARATO
Cara, isso dói na alma... ver um Concha y Toro aqui custando R$50.00 sendo que lá dava pra pagar uns R$30.00. Ou poder pegar qualquer vinho a R$10.00 e ele ser gostoso!

COMIDAS
Como toda boa de garfo, tenho saudade da comida chilena. O completo, os morangos lindos e saborosos a preços honestos (já comprou morango aqui no Brasil? É um assalto), os frutos do mar mais baratos, os peixes mais frescos, o salmão por um preço aceitável, a cazuela, a palta sempre madura...

Eu poderia citar os bairros como o Lastarria, Paris-Londres, os bares, restaurantes, mas isso é muito específico e que não se pode comparar com São Paulo...
Já faz 4 meses que voltei e ainda sinto que não me desliguei completamente. Fato é que essa experiência me marcou muito e eu nunca vou esquecer das coisas que aprendi, dos tapas na cara que tomei, dos amigos que fiz - e continuarão sendo amigos - e do estilo de vida mais low profile que provei...



quarta-feira, 15 de junho de 2016

Trazendo seu animal de estimação pro Brasil: os trâmites

Bom e depois de 4 meses da minha volta pro Brasil, semana passada FINALMENTE o Viejo (meu cocker) chegou :)
Foi uma longa espera por diversos motivos: quando fui pra Santiago buscar minhas coisas e devolver o apartamento, ele tava com sarna. Claro que não podia viajar assim, então deixei ele aos cuidados primeiro de uma amiga minha, que ficou com ele até o tratamento terminar (6 semanas) e depois com a Elba no seu hotelzinho pet. Depois, já sarado eu tentei ver diversas maneiras de trazê-lo.
Pensei em ir buscá-lo, mas as passagens estavam muito caras e eu ia precisar de pelo menos uns 5 dias pra poder pedir o documento no SAG (serviço agrícola chileno). E como faz só 5 meses que estou trabalhando aqui na agência, não ia rolar. Entrei em contato com dois agentes aduaneiros indicados pela Gol e pela Tam, mas eles cobravam os olhos da cara.
Dei muita sorte, porque a afilhada da Elba tinha viagem marcada pro Brasil no dia 10/06, então aproveitamos dele vir junto, porque um dos meus maiores medos era dele viajar sozinho e ser extraviado. Extraviam bagagem, porque não extraviariam um cachorro?

No post de hoje então, vou falar sobre todos os trâmites de trazer um animal de estimação do Chile pro Brasil. Acho que farei outro falando sobre a Elba, seu hotel e o cuidado que ela teve com o meu filho de 4 patas. Melhor fazer essa divisão, assim o post não fica muito longo :)
Não sei se a burocracia é a mesma pra outros países e/ou continentes, ok?

Os sites que eu mais consultei nesse período foram o do SAG e o do Ministério da Agricultura do Brasil.
Site do SAG: http://www.sag.cl/ambitos-de-accion/salidas-de-mascotas-de-chile
Site do Ministério da Agricultura do Brasil: http://www.agricultura.gov.br/animal/animais-de-companhia/transporte-internacional

No site do Ministério da Agricultura tem um link pra você visualizar um PDF com todas as regrinhas.
No começo eu achei muita informação e fiquei totalmente perdida sem nem saber por onde começar. Depois, lendo com atenção, vi que o melhor a se fazer era montar um cronograma. Ficou mais fácil de se organizar e não perder o 'timing' de nenhum dos trâmites exigidos.

O Viejo nunca veio ao Brasil, portanto no PDF me atentei ao item 14 situação 2. O animal está vindo para o Brasil ou retornando ao país num período superior a 60 dias. E como eu perdi a carteira de vacinação dele, então ele é considerado primovacionado contra a raiva (vacinado pela primeira vez).

Vamos lá!

- 21 dias antes da viagem, ele precisa ser vacinado contra raiva

- 15 dias antes da viagem, o animal precisa ser desparasitado interna e externamente

- 10 dias antes da emissão do CVI (certificado emitido pelo ministério agrícola do Chile), o animal deve passar por um exame clínico veterinário que ateste que o animal está totalmente saudável e livre de qualquer doença. Além disso, nesse exame, deve constar todos os tratamentos que o animal passou nos últimos 3 meses.

Para pedir o CVI, você deve ter tudo isso acima em dia e se pede no escritório do SAG que fica no Paseo Bulnes, bem pertinho do La Moneda. Eles demoram 1 dia útil para te entregar.
Não sei se o atendimento é demorado, porque não fui eu que fui pedir.

Nessa etapa, é muito importante você prestar atenção em TODAS AS DATAS e fazer tudo certinho. Um dia a mais que você ultrapassa e é bem capaz que não te deixem viajar com o animal.


OUTRAS CONSIDERAÇÕES IMPORTANTES:

- Quando for comprar sua passagem, é preciso fazer a reserva do seu animal na hora. Parece que eles tem um limite de uma carga viva por vôo. Consulte com eles as especificações da caixa de transporte. Ela precisa ser grande o suficiente pra que o animal dê uma volta completa entre si.

- O Viejo não precisou de passaporte e nem microchip. Mas leia atentamente o PDF do Ministério da Agricultura do Brasil, lá eles explicam melhor quem precisa do passaporte e etc.

- Um conselho de uma amiga minha que já viajou com os cachorros dela pra todos os lados é sempre GARANTIR que o animal embarcou no mesmo vôo que você. Quando estiver dentro do avião, peça pra comissária de bordo confirmar com o piloto.

- Como o meu cachorro é MUITO tranquilo, não foi preciso dar nada pra ele dormir. Converse com o seu veterinário se eles recomendam.
Além disso, ele só comeu de manhã e deixaram uma garrafinha pra ele ir bebendo água durante a viagem.

Acho que por hoje é só.
Quero deixar também uma dicona caso você esteja indo pra Europa com o seu bichinho. A Debbie do blog Pequenos Monstros e o namorado dela montaram um e-book incrível com todas as dicas e recomendações necessárias. O negócio é completo mesmo e a Debbie é dog lover total, então pode confiar. Clica aqui e boa sorte :)

Próximo post, falarei sobre a chegada dele aqui, a readaptação e claro, sobre o hotelzinho que cuidou dele durante todo esse tempo.

Beijos e fiquem com essa foto do Viejo esperando pra embarcar <3




segunda-feira, 13 de junho de 2016

Dicas na hora de reservar seu hotel

Como prometido, aqui a segunda parte do post sobre hospedagem em Santiago.
Mudei o título em relação a primeira parte do post, porque aqui não estou dando dicas de lugares pra ficar em Santiago e sim na hora que você for fazer a sua reserva.

Quero falar sobre algumas coisas pra vocês não darem com a cara na porta quando chegarem lá. Parece coisa idiota, mas muita gente não se liga nesses detalhes e acaba tendo problemas. E como trabalhei nessa área, acho que posso ajudar.

Quero deixar claro que não sou formada em hotelaria. As dicas aqui foram com base na minha experiência enquanto trabalhei nessa área, ok?

1- Prefira sempre fazer a reserva do seu hotel/hostel/apart hotel diretamente com a empresa. Fica mais fácil de conseguir desconto. Viu uma promoção no Booking.com, Decolar.com, Expedia etc? Antes de fazer a reserva, ligue ou mande e-mail direto pro hotel. Diga que viu no site um desconto e pergunte se eles podem respeitar esse valor. Pro hotel é interessante fazer a reserva diretamente com o passageiro, porque assim evita-se o pagamento de comissão pros sites.

2- Leia BEM as entrelinhas na hora de fechar reserva por algum site, especialmente o Booking.com. Onde eu trabalhava dizia que oferecíamos estacionamento, mas que estava sujeito a disponibilidade. Muitos passageiros chegavam lá de carro achando que podiam estacionar e ficavam putos da vida quando dizíamos que não tinha mais vagas disponíveis. Amigo, no contrato está escrito SUJEITO A DISPONIBILIDADE.

3- Reservas reembolsáveis e não reembolsáveis. Isso já gerou muitos problemas pra mim pelo simples fato que eu já comentei acima: AS PESSOAS NÃO LÊEM O CONTRATO ANTES DE FECHAR A RESERVA.

Quando você faz uma reserva pelo Booking.com, você dá o seu cartão de crédito, certo? No caso de optar por uma REEMBOLSÁVEL, o cartão é apenas para GARANTIR a sua reserva. Nada vai ser cobrado e o pagamento da estadia é feito no momento da chegada ao hotel (ou no check out, depende do estabelecimento). E você ainda pode cancelá-la de maneira gratuita até dois dias antes da sua chegada. E caso você não faça esse cancelamento, é cobrado somente o valor da primeira noite.

Agora, se você opta por uma reserva NÃO REEMBOLSÁVEL, a história é outra: o valor TOTAL da estadia é cobrado antecipadamente no seu cartão. Você fez a reserva não reembolsável HOJE, logo o hotel cobrará HOJE de você o valor total. Se o seu cartão não tiver crédito, o hotel vai pedir outro cartão e outro e outro até passar. E se não passar, eles tem o direito de cancelar sua reserva sem direito a reembolso. E você NÃO PODE CANCELAR uma reserva não reembolsável.
Claro que você pode entrar em contato direto com o lugar, mas a política das non refundable reservations é essa.

Acho muito importante esse tópico porque já tive que cancelar reservas não reembolsáveis em cima da hora porque o hotel estava sobrevendido e precisávamos dar prioridade pras reservas que já estavam pagas e/ou eram reembolsáveis. Daí a pessoa não recebeu o email com o aviso de cancelamento, chegaram no hotel e deram com a cara na porta porque não tinha mais quarto. Ficaram putos, reclamaram, xingaram, mas so sorry. A política é essa.

4- Preste atenção na hora de fazer a reserva e nos horários de check in e check out. É idiota, mas já aconteceu de uma família de argentinos reservarem com data de saída pra, sei lá, dia 10/06 e eles acharem que podem sair as seis da tarde.
No geral, o horário de check in é A PARTIR das 14:00pm e o check out é OBRIGATORIAMENTE ao meio dia. Quando aconteceu isso dos argentinos, demorou pra eles entenderem que se a reserva tinha data de saída dia 10, então eles tinham que desocupar o quarto até meio-dia. Depois que se tocaram que tinham errado, eles ficaram mega sem graça, porque já tinham gritado e dado escândalo.
NÃO SEJA ESSA PESSOA, tá?

Se você precisa de um early check in ou um late check out, AVISE COM ANTECEDÊNCIA. Não chega lá as 6 da manhã achando que já vai poder entrar no quarto. SE o hotel tiver disponibilidade, capaz deles deixarem você entrar antes e talvez seja preciso pagar uma taxa extra por isso, mas de novo: tudo depende do estabelecimento.

5- Hostel geralmente NÃO TEM ELEVADOR, tá? Já cansei de ver cara feia de passageiro (principalmente brasileiro) que chega lá com mala de rodinha e 200 outras bagagens e pergunta: tem elevador? Não, não tem. E você vai ter que subir as escadas com suas coisas, porque também não tem carregador de mala. Por isso é importante pesquisar muito bem antes o lugar que você vai se hospedar.

6- Se você vai se hospedar num hostel, tome cuidado com os seus pertences. Sempre tem câmeras de segurança e tal, mas infelizmente tem ladrãozinho em qualquer lugar. O recepcionista está lá fazendo o trabalho dele de olho no que acontece, mas nem sempre é possível pegar alguém no flagra. Em lugares muito turísticos é muito comum, infelizmente, acontecer esses pequenos furtos. Por isso, se você estiver na recepção, não largue o celular/câmera/mochila/whatever em qualquer lugar. O estabelecimento não se responsabiliza por perdas. Eles podem te ajudar chamando a polícia e te orientando o que fazer no caso de acontecer alguma coisa, mas não vão te ressarcir.
Em todos os hostels tem lockers nos quartos. Guarde suas coisas lá fechadas com cadeado. Pra que dar sopa pro azar se você pode evitar essas coisas?

7- Tem alguma dúvida? Pergunta? Questionamento? Medo? Não hesite em mandar e-mail ou se preciso for, LIGUE pro lugar. Os recepcionistas estão lá pra te ajudar em TUDO que você precisar. Vá com tudo bem explicadinho e assim você evita problemas e dores de cabeça. E pode curtir sua viagem numa boa, numa nice.

Tem alguma coisa que você queira perguntar?
Me manda um email: fuimorarnochile@gmail.com

Beijos e até a próxima.

quinta-feira, 2 de junho de 2016

"O alto preço de viver longe de casa" por Sábias Palavras

Antes de postar a parte 2 do último post, quero compartilhar aqui esse texto que pipocou na minha timeline, e há muito tempo que eu não me sinto tão identificada assim.
O texto não é meu, não sei o nome do(a) autor(a), só sei que veio de um site chamado "Sábias Palavras".
Deixarei em negrito as partes que eu mais me encontrei. Eu não poderia ter descrito melhor o que é morar sozinho(a) em outro país/cidade/estado.



Voar: a eterna inveja e frustração que o homem carrega no peito a cada vez que vê um pássaro no céu. Aprendemos a fazer um milhão de coisas, mas voar… Voar a vida não deixou. Talvez por saber que nós, humanos, aprendemos a pertencer demais aos lugares e às pessoas. E que, neste caso, poder voar nos causaria crises difíceis de suportar, entre a tentação de ir e a necessidade de ficar.
Muito bem. Aí o homem foi lá e criou a roda. A Kombi. O patinete. A Harley. O Boeing 737. E a gente descobriu que, mesmo sem asas, poderia voar. Mas a grande complicação foi quando a gente percebeu que poderia ir sem data para voltar.
E assim começaram a surgir os corajosos que deixaram suas cidades de fome e miséria para tentar alimentar a família nas capitais, cheias de oportunidades e monstros. Os corajosos que deixaram o aconchego do lar para estudar e sonhar com o futuro incrível e hipotético que os espera. Os corajosos que deixaram cidades amadas para viver oportunidades que não aparecem duas vezes. Os corajosos que deixaram, enfim, a vida que tinham nas mãos, para voar para vidas que decidiram encarar de peito aberto.
A vida de quem inventa de voar é paradoxal, todo dia. É o peito eternamente divido. É chorar porque queria estar lá, sem deixar de querer estar aqui. É ver o céu e o inferno na partida, o pesadelo e o sonho na permanência. É se orgulhar da escolha que te ofereceu mil tesouros e se odiar pela mesma escolha que te subtraiu outras mil pedras preciosas.
E começamos a viver um roteiro clássico: deitar na cama, pensar no antigo-eterno lar, nos quilômetros de distância, pensar nas pessoas amadas, no que eles estão fazendo sem você, nos risos que você não riu, nos perrengues que você não estava lá para ajudar. É tentar, sem sucesso, conter um chorinho de canto e suspirar sabendo que é o único responsável pela própria escolha. No dia seguinte, ao acordar, já está tudo bem, a vida escolhida volta a fazer sentido. Mas você sabe que outras noites dessa virão.
Mas será que a gente aprende? A ficar doente sem colo, a sentir o cheiro da comida com os olhos, a transformar apartamentos vazios na nossa casa, transformar colegas em amigos, dores em resistência, saudades cortantes em faltas corriqueiras?
Será que a gente aprende? A ser filho de longe, a amar via Skype, a ver crianças crescerem por vídeos, a fingir que a mesa do bar pode ser substituída pelo grupo do whatsapp, a ser amigo através de caracteres e não de abraços, a rir alto com HAHAHAHA, a engolir o choro e tocar em frente?
Será que a vida será sempre esta sina, em qualquer dos lados em que a gente esteja? Será que estaremos aqui nos perguntando se deveríamos estar lá e vice versa? Será teste, será opção, será coragem ou será carma?
Será que um dia saberemos, afinal, se estamos no lugar certo? Será que há, enfim, algum lugar certo para viver essa vida que é um turbilhão de incertezas que a gente insiste em fingir que acredita controlar?
Eu sei que não é fácil. E que admiro quem encarou e encara tudo isso, todo dia.
Quem deixou Vitória da Conquista, São José do Rio Preto, Floripa, Juiz de Fora, Recife, Sorocaba, Cuiabá ou Paris para construir uma vida em São Paulo. Quem deixou São Paulo pra ir para o Rio, para Brasília, Dublin, Nova York, Aix-en-provence, Brisbane, Lisboa. Quem deixou a Bolívia, a Colômbia ou o Haiti para tentar viver no Brasil. Quem trocou Portugal pela Itália, a Itália pela França, a França pelos Emirados. Quem deixou o Senegal ou o Marrocos para tentar ser feliz na França. Quem deixou Angola, Moçambique ou Cabo Verde para viver em Portugal. Para quem tenta, para quem peita, para quem vai.
O preço é alto. A gente se questiona, a gente se culpa, a gente se angustia. Mas o destino, a vida e o peito às vezes pedem que a gente embarque. Alguns não vão. Mas nós, que fomos, viemos e iremos, não estamos livres do medo e de tantas fraquezas. Mas estamos para sempre livres do medo de nunca termos tentado. Keep walking.